É esse o resumo da reportagem do Estado de São Paulo publicada hoje que alude a uma pesquisa contextual realizada na Unicamp com base nos dados do SAEB. A pesquisa se tornou artigo publicado em setembro do ano passado na renomada revista "Educação e Sociedade".
Tanto a reportagem quanto a pesquisa são extremamente coerentes, embora o foco da última tenha sido o uso do computador (não de laptops educacionais), é inegável que a motivação para a análise partiu da política agressiva de inclusão digital do governo federal e principalmente de suas intenções de implementar o modelo 1:1 no Brasil.
Os pesquisadores tem um vasto currículo no estudo das TICs e dos seus impactos sociológicos na educação e curiosamente sua produção normalmente faz uma abordagem positiva, ao contrário de outros "pesquisadores" viceralmente contrários à idéia de ampliação da cultura digital na escola.
Exatamente por isso, este texto científico tão crítico merece destaque. Provavelmente ele também é a primeira pesquisa estatística séria sobre o tema realizada no país. Antes dela teríamos os próprios dados do SAEB que afirmam melhora no desempenho escolar de alunos com acesso a computadores - uma conclusão provada equivocada logo no início do artigo em questão.
Em resumo: junto com a avaliação do ensino básico, uma prova individual aplicada aos alunos, o SAEB perguntou se a criança utilizava o computador para auxiliá-lo nos estudos da matéria em questão (português ou matématica). Com base nestes dados e outras fontes sócio-econômicas os pesquisadores concluíram que as crianças que fizeram uso moderado ou intenso de computadores (provavelmente em casa) no apóio aos estudos tiveram os piores resultados no "provão" do SAEB. Apenas os que fizeram "uso leve" de computadores no apóio ao estudo tiveram um desempenho melhor perceptível.
Essa conclusão, vinda de pesquisadores sérios e, de certo modo, entusiastas na área parece um "balde de água-fria" nos defensores da ampliação do uso das TICs na educação, principalmente no ensino básico. No entanto, exatamente pela seriedade, a própria pesquisa levanta outras discussões e aponta limitações próprias e do universo acadêmico no geral. É uma pena que numa obra dessa envergadura apenas a conclusão objetiva transcrita acima ganhe ampla divulgação nos meios de comunicação.
Para facilitar transcrevo a parte final do artigo no qual os autores analisam alguns possíveis motivos para o baixo desempenho dos alunos mais incluídos digitalmente:
Não há na bibliografia científica nacional (não estamos falando da bibliografia meramente 'teórica' construída sem extenso apoio empírico) nenhum reconhecimento da existência desta situação. Por esta razão, qualquer hipótese explicativa será necessariamente especulativa. A bibliografia sobre o 'paradoxo da produtividade' sugere uma hipótese: usuários [de computadores] mais pesados se dedicam aos estudos durante menos tempo e com menos afinco do que seus colegas, como padrões de menor tempo de uso. Existem outras hipóteses plausíveis: (...) os usuários intensivos de computadores já detêm um bom conhecimento do uso de programas de cálculo e de correção de ortografia. Dessa maneira, a aprendizagem de capacidades associadas à escrita e ao calculo manual é considerada por estes alunos cada vez menos relevantes. Porém, o SAEB testa o domínio de conhecimentos em matemática e português sem recurso ao uso do computador. Assim, os testes ignoram a natureza das capacidades dos usuários do computador. Uma terceira hipótese é derivada de um estudo recente de Bezerra (2006) que demonstrou que os alunos que trabalham por mais de duas horas por dia têm notas inferiores àqueles que não trabalham. Dessa forma, um número significativo de alunos que usam o computador para fazer os trabalhos de casa pode estar trabalhando, o que explicaria seu acesso ao computador. Ou seja, a relação entre uso intenso do computador e as notas baixas obtidas pode ser parcialmente devido ao fato de que o aluno trabalha.
São hipóteses que os pesquisadores não podem provar e, como se vê no início da citação, eles são muito críticos às teorias não-empíricas. Mas apontam caminhos explicativos, já que a relação por eles encontrada não pode ser considerada casual ou sistêmica ("uso de computadores = má educação").
Acrescento que o uso do computador da forma como levantada pelo SAEB, mesmo que como apoio ao estudo, não é a mesma coisa que o uso de computadores dentro da sala de aula, no apoio às atividades em classe e integrados conscientemente a um projeto pedagógico. Neste caso, inexistente em escala razoável no Brasil, eventuais avaliações de ensino poderiam ser bem mais positivas, mesmo que mantendo o escopo atual dos testes do SAEB.
É claro que esta é uma hipótese "não-empírica", mas é difícil supor que um esforço de integração consciente do computador à escola, com as informações que hoje possuímos, dessem resultados mais catastróficos que aqueles que já obtemos em nossas escolas. Digo isso porque projetos como o UCA do governo federal visam uma renovação completa no modo de organizar e ensinar nas escolas, e o computador é apenas uma parte dessa revolução.
Além disso, em outros países, em especial na Europa, pesquisadores já analisam modelos híbridos que potencializem a experiência cognitiva com as TICs e outros recursos não informacionais. Há todo um novo campo educacional já em andamento, mas no Brasil, de fato, pouco se tem avançado neste sentido, quiçá empiricamente.
Leia a notícia do Estadão e o artigo na íntegra no Scielo (lá você poderá imprimir ou guardar uma cópia em PDF).
7 comentários:
Caro Jaime,
Podem ser extremamente sérios e competentes. Não deixo de respeitá-los por isso. Agora, não posso deixar de comentar que o artigo da revista (não li o relatório da pesquisa) é raso e inconseqüente. Raso, porque não não dá visão de conjunto; educação é uma coisa seriíssima e complexa para ser tratada com meros estudos estatísticos, por melhor que sejam. E inconseqüente, porque certamente a difusão é formadora de opinião e levará as pessoas pouco ou nada inseridas no contexto a pensarem (mais uma vez) de forma não-contextualizada.
O que o artigo — como de resto a maioria das pessoas têm feito, infelizmente — presume a Educação e a Escola como intocáveis, fazendo com que as tecnologias sejam "O" objeto de análise crítica, quando na verdade, deveria ser o oposto.
Publiquei em http://www.peabirus.com.br/redes/form/post?topico_id=8366 um tópico sobre o assunto.
abs,
Paulo
O que eu gostaria de saber é: E o rendimento das crianças do projeto UCA? Melhorou? Piorou? Continua estável?
Todos estamos "carecas de saber que há laboratórios empoeirados nas escolas..." e outros mal usados, portanto, jovens que só usam o computador para MSN e Orkut e jogos on line durante as horas em que deveriam estar estudando...quem tem filho adolescente já sabe muito bem qual o resultado, nem precisava tanta pesquisa, né amigo? Tenho dois: um de 21 (AGORA está aprendendo a estudar!) e outro de 5 que já está lendo, pois aprende desde já a usar o pc para aprender!
Aproveito para deixar registrada aqui minha admiração por seu trabalho, sempre que posso visito seu espaço!
Olá! Sou estudante de informática do centro federal de campos, e estou para fazer meu projeto final relacionado a educação. Atualmente estou fazendo um trabalho com redes mesh e andei lendo seu blog nos ultimos dias. Gostaria de saber se posso referenciar alguns de seus artigos - com os devidos creditos, obviamente.
se tiver algo mais a dizer sobre o assunto estou realmente interessada em ouvir - principalmente sobre XO e redes mesh (ensino a distancia).
Agradeço desde já.
( rozanadeoliveira@msn.com )
Caro Jaime,
Temos o mesmo ponto de vista, e acredito que podemos sim, usar TICs com metodologias e aliadas ao pedagogos que tem visão de inovar na educação segue palavras do Prof. José Antonio Teixeira
“A educação hoje tem um desafio gigantesco: a escola passiva se esvai, deixando de ser agente do processo, e se torna um novo e verdadeiro elo, chamado mudança. Seu ofício: fazer acontecer antes de cada pôr do sol, porque, após cada alvorecer, um mundo novo estará girando... e com muito daquilo que pouco antes se chamava futuro.”
Prof. José Antonio Teixeira
Está em nosso Blog se puder de uma olhada um pouco de História do Caderno digital http://educst.blogspot.com/
Abs
Junior
Educ
Olá Gustavo, tudo jóia?
Meu nome é Vitor Pepicon, e escrevo um blog mobilidade, o gadiguetes.com. Gostei do conteúdo do seu site, e como acredito que ele também será útil para meus leitores incluí seu link no meu blog.
O tema que você trata é muito importante. Uma vez que a tecnologia está invadindo todo lugar, gostaria de ver mais pessoas preocupadas em transformá-la em avanços na educação. Sei que não é fácil, e que somente com muito esforço e análise conseguimos evoluir de fato. Não páre de postar. Espero que atinja seus objetivos com seu blog.
Um grande abraço!
Agradeço o incentivo Vitor. Estarei retomando as postagens regulares em breve.
Aproveito para avisar o José que conheço o Caderno Digital, apesar de nunca ter escrito sobre ele na esperança de conseguir juntar informações suficientes (como fiz quando "dissequei" o Mobilis).
Mas ainda pretendo fazer uma análise minha definitiva sobre esta esperiência.
Um abraço,
Jaime.
Puxa,Realemente creio que o com a mentalidade e o conhecimento dos jovens de hoje
o melhor seria o não acesso aos computadores.Parece radical num é?
Bem trabalho numa Ong,Se chama Centro Cultural Piolin,aqui na Paraiba,fazemos trabalhos de artes e cultura.O uso dos computadores da escola são exclusivos para sites de pesquisa,digitação e etc.Pois percebemos que eles já vemn com vontade de acessarem okut,msn e por ai vai e passa-se as horas,e não aprenderam nada.Vimos que esssa medida na escola surtil no começo uma revolta entre as criançãs,mas com o tempo se acostumaram,e agora compartilham ideias de curiosidades que viram na net.Consideramos que proibir nesse caso foi um passo positivo
Obrigada moço
como já disse em post anterior
Belo blog
se quiser fazer uma visita ao meu
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